sexta-feira, 30 de julho de 2010

Ritmos

O adarrum é o ritmo mais citado como característico de Ogun. É um ritmo “quente”, rápido e contínuo, que pode ser executado sem canto, ou seja, apenas pelos atabaques. Pode, também, ser executado com o objetivo de propiciar o transe. O toque de bolar, por exemplo, se faz ao som do adarrum.
O aguerê é o ritmo de Oxóssi. É acelerado, cadenciado e exige agilidade na dança, do mesmo modo que a caça exige a agilidade do caçador.
O ritmo de Obaluaê é o opanijé, um ritmo pesado, “quebrado” (por pausas) e lento. Este ritmo lembra a circunspeção deste deus das epidemias, ligado à terra.
O bravum, embora não seja atribuído especialmente a algum orixá, é freqüentemente escolhido para saudar Oxumarê, Ewá e Oxalá. É um ritmo relativamente rápido, bem dobrado e repicado. A dança preferida de Xangô se faz ao som do alujá, um ritmo quente, rápido, que expressa força e realeza recordando, através do dobrar vigoroso do Rum, os trovões dos qual Xangô é o senhor.
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Ijexá, o único ritmo tocado com as mãos no rito Ketu é, por excelência, o ritmo de Oxum. É um ritmo calmo, balanceado, envolvente e sensual, como a deusa da água doce, à qual faz alusão. Ele é tocado ainda para o orixá filho de Oxum, Logun-Edé e, algumas vezes para Exu e para Oxalá.
Para Iansã, divindade dos raios e dos ventos toca-se o agó, ilu, ou aguerê de Iansã, termos que designam um mesmo ritmo que, de tão rápido, repicado e dobrado, também é conhecido como “quebra-prato”. É o mais rápido ritmo do candomblé, correspondendo à personalidade agitada, contagiante e sensual desta deusa guerreira, senhora dos ventos e que tem poder de afastar os espíritos dos mortos (eguns).
Sató, um ritmo vagaroso e pesado, é geralmente tocado para Nanã, considerada a anciã das iabás (orixás femininos).
O batá, talvez um dos ritmos mais característicos do candomblé, pode ser tocado em duas modalidades: batá lento e batá rápido, sendo o primeiro executado para os orixás cuja dança comedida denotam certas características de suas personalidades, como a dança de Oxalufã, o deus arcado e velho que, com seu paxorô (cajado), criou o mundo. Significativamente, o termo batá, designa também o tambor de duas membranas, afinadas por cordas, cujo uso nos candomblés do Norte e Nordeste do Brasil é tão difundido que talvez por este motivo o ritmo tenha tomado seu nome, ainda quando não executado por este instrumento.
Vamunha é um outro ritmo, também conhecido por: ramonha, vamonha, avamunha, avania ou avaninha, tocado para todos os orixás. É um toque rápido, empolgado e tocado em situações específicas como a entrada e saída dos filhos de santo no barracão e para a retirada do orixá incorporado. É nesse momento que o orixá saúda os pontos de axé da casa e se retira sob a aclamação dos presentes.
Todos os toques (ritmos) acima são característicos do rito Ketu e, conforme procuramos demonstrar, associa letra, melodia e dança que, integrados, “narram” a experiência arquetípica dos orixás, vividas em nível individual e grupal e cujo ápice é o transe. Alguns destes ritmos são tão personalizados dos orixás que podem dispensar as letras ou mesmo a dança como elemento de identificação. É o caso do alujá, do opanijé e do agó (quebra-prato), consagrados a Xangô, Obaluaê e Iansã, respectivamente.
Os tambores são o elo com o passado; sendo um meio de comunicação, de acompanhamento de danças, de transmissão de mensagens sagradas ou profanas, o tambor foi o guardião da memória-recordação, como se denomina a capacidade dos africanos de conservar, transmitindo de pais para filhos, os valores de sua tradição e os códigos de sua identidade, unificando as emoções coletivas.
A dança não se desenvolve sem o tambor, que é a escritura sonora que o dançarino deve acompanhar ao ler, ouvindo, seu ditado. A escritura do tambor, “pode difundir as notícias mais rapidamente que a escritura gráfica”. Para compreender o valor semântico do tambor, é necessário remeter-se às línguas africanas, que são sistemas fônicos com estratos sonoros que dão às palavras um significado diferente, conforme a gravidade sonora dos vogais. Os sistemas de escritura são pouco adequados para escrever os tons graves, agudos e intermédios, sobretudo estes últimos. Em nenhuma escritura existem signos que possam representá-los. Em troca, o tambor reproduz com fidelidade a linguagem tonal das línguas africanas.
A linguagem do tambor é, portanto, a reprodução imediata e natural da língua: é uma “escritura” intelegível para qualquer pessoa que tenha a prática suficiente, só que, ao invés de se dirigir à vista, está destinada ao ouvido. O europeu jovem aprende a relacionar, na escola, os sinais óticos com os sentidos; do mesmo modo, o africano jovem tinha que aprender outrora a arte de captar os sinais acústicos do tambor.
Povo do Santo

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